Sentei à mesa uma outra vez.
Tomamos os nossos lugares e ajeitamos as cadeiras.
Colocamos os guardanapos no colo e enchemos mais uma vez as taças com uma safra qualquer. Esperemos um pouco mais...acendemos as velas para que a nossa encenação de felicidade seja mais perfeita.
(Não sei porque precisamos de fingir intimismo e intimidade.)
Vais levar o copo aos lábios para não provares os meus e eu vou escolher o lugar mais afastado do teu para não encostares a tua cabeça no meu ombro.
Vamos trocar palavras circunstanciais e levantarei para retocar a maquiagem e carregar no batom e não te beijarei porque, como te disse, não queres que fiques manchado.
Tu, por sua vez, vai sorrir e fingi agradecer a minha preocupação.
Vamos reger o nosso silêncio sob a batuta dos talheres a bater nos pratos e temperá-lo com os comentários educados sobre o requinte da comida.
Recusaremos ser servidos, alegando estar satisfeitos e as travessas continuarão dispostas sobre a mesa onde nos sentávamos.
Assim está o meu amor, onde acabo por me recusar aos poucos e a escassez dos afetos vai sendo cada vez mais gritante.
(Hoje nem as migalhas tenho para oferecer...porque agora sempre insisto em sacudir a toalha.)
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[E só pra não esquecer:
Quando fores embora
Leva os discos,
os sapatos,
a velha máquina de escrever,
e dá um jeito de caber na mala
todo o amor que não me deste.]
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