quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

:: Quarta de Cinzas ::


Olhava as ladeiras por inteira, a cidade ainda em cores,mas agora em silêncio.Havia um arrepio a correr-me por dentro.Ainda era verão, mas naquele dia resolveu nascer menos brilhante.

O meu coração veio a flutuar desde lá de baixo, quando me deixei ancorar na margem daquele rio que pecorre toda a cidade. Atravessou o Cais, deu uma volta pelo Quatro Cantos, para, finalmente, aterrar em você.

Sinto-me anestesiada e em frenezi.Como que em solidariedade, até me parece confortar.

Consome-me já uma saudade melancólica da sua imagem que existiu à minha volta, como a falta que se sente de alguém que se sabe que se pode perder na distancia, mesmo ainda não o tendo, de fato, perdido e ainda o tendo nos braços.

Acordei desta sensação solitária com a mão dele a apertar a minha. Já quase o esquecia ao meu lado, não fosse um calor protetor e invisível - aos olhos - ter-me sempre aconchegado, desde o início da caminhada.

Olhei para o lado e o vi sempre ali ao alcance de minhas mãos e preenchendo o vazio com coisas novas e concretas.De repente, no caminho de volta,ri como se nada de demasiado grave houvesse no mundo e nunca, ainda, lhe tivessem feito mal, nem receasse poderem vir a calar-lhe esse riso.

Eu fico a olhá-lo e admira-lo .E sinto-me preenchida por tudo que vem dele.
E fomos, então, duas almas encontradas a pairar no meio da praça,na beira do rio,com encontro marcado entre milhões de pessoas,cobertos de vontades e descobertas... que riam alheias aos olhares e aos cochichos.

Quando o abracei para ir embora, a minha angústia pareciam lágrimas de um sentimento gigante a cair-me dos olhos.
E é assim que deixamos acalmar o riso, para descansarmos no ombro um do outro.

Não sei quanto tempo passou, nem se foi sonho ou fantasia, mas quando desfizemos esse abraço, fui embora sem olhar pra tras e só via um rosto que me acalma e me fortalece.
Mas, ao concentrar-me melhor, constato que basta eu fechar meus olhos que ele continuou a morar no fundo deles.

Quando soltei a sua mão, não sorri-me o último suspiro prolongado deste nossos dias.Mas eu sei que, aqui, a distância nunca será nada para o que une as almas.

Olhei a cidade inteira, agora com um sorriso mais descontraído, porque, lembro-me, a minha casa é onde está o meu coração.Pensava coisas bobas... sentada na janela do ônibus, encostando a cabeça na vidraça, deixo a paisagem correr, e pensava demais em você...

Sei que era necessário recomeçar a caminhar, não sei bem para que direção,mas apenas levando uma das minhas duas moradas ao meu lado, para sentir você segurando a minha mão e dominando meus pensamentos...

(...)


Qualquer coisa que chamam de impossível...fez-me acreditar.
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["Contarás nos dedos os dias que faltam para que termine o mês,
não são muitos, pensarás com alívio.
Embora saibas que há perdas realmente irreparáveis
e que um braço amputado jamais se reconstituirá sozinho."
C.F.A.]


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